Brasília 2008, a despedida.

De volta ao lar, mas de cabeça feita após mais um vôo alucinante. Sexta-feira, 22/08, foi dia de despedida no cerrado. Já na quinta-feira anterior a ventaca que rolava deu lugar à calmaria, mas a barca foi combinada apenas para a sexta, afinal os voadores de Brasília também precisam trabalhar. Meio dia, rampa vazia no cerrado, apenas quatro asas iriam decolar. Soprava uma brisa modesta indicando que a corrida teria que ser caprichada e que não haveria sustentação na parede, ou seja, teríamos que nos jogar no buraco para buscar o elevador. Evandro decolou na frente, bateu em algumas bolhinhas mas nada consistente, assim que entrou uma pressãozinha parti para o vôo - melhor dois a procurar do que apenas um a birutar - seguido pelo Cabelo e pela Titá. Decolei para cima, mas foi só ilusão, não consegui colocar nem 100 metros da rampa, pelo menos fiquei com um pouco mais de combustível e joguei para cima do morro da Coca onde o Evandro tentava arredondar uma termal. Era alarme falso, nada pegamos e fomos ficando ambos cada vez mais baixos. Não queria olhar para o pouso de jeito nenhum, ficar lá embaixo não era a despedida esperada, mas quase aconteceu. Evandro e Cabelo acabaram pousando na Coca. Já pensando na aproximação senti uma leve pressão na barra, o suficiente para aumentar minha determinação para sair do buraco. Era uma térmica muito falhada e sem potência, deu um trabalho daqueles, mas consegui me erguer novamente à altura da decolagem, não mais do que isso. Não tinha para onde ir, já que a termal não rendeu o suficiente. O fato do resgate ter que descer para buscar a turma foi fundamental nesse início de vôo, pois desencanei com a situação e percebi que o único jeito de sair dali seria através de uma boa térmica, daquelas que crescemos junto com elas. Passei a forçar o vôo em direção à Pamonharia, no caminho bati numa bolhinha como a que tinha me salvado anteriormente, mas suficiente apenas para me dar mais fôlego. Abandonei aquela e novamente fui vasculhando tudo até a pamonha, quando esbarrei em outra bolha, dessa vez ainda falhada mas um pouco mais forte. Resolvi esquecer de tudo e me concentrar ao máximo, foi melhor do que eu tinha pedido, quanto mais subia melhor ficava. Cheguei à base da nuvem a 1.800 metros entre a rampa do Dicram e a cachoeira do Itiquira. O vento era meio través e obrigava uma boa forçada, perdi bastante altura na tirada, e assim foi durante todo o vôo, a asa não estava rendendo muito. À frente, já perto do asfalto um dust mostrou o caminho, botei para cima novamente, mas nessa hora tomei a decisão de fazer um vôo diferente do que já tinha rolado nos outros dias quando fiz o mesmo caminho tradicional para a Esplanada. Nisso já tinha derivado até quase a lagoa bonita, mas optei por voltar ao asfalto e tentar voar sempre à esquerda da reserva, por sobre a pista que leva à rampa. O tempo todo foi batalhado, muitas enroscadas, boa altura, uma tirada, asa afundando geral, outra térmica, sobe de novo e assim fui indo. Passada a reserva, trevo da rampa, tirada para Planaltina, novas enroscadas, tirada para o Pîvô Central, perde tudo, sobe de novo, agora rumo à Guerra Eletrônica, pela esquerda de Sobradinho. A essa altura do vôo achei, sinceramente, que conseguiria chegar à Esplanada, mas aí fui perdendo altura num sombreado imenso, subestimei justamente o final do vôo e isso me levou de vez para o chão. O que não foi nada ruim, pois tudo que tinha rolado naquele vôo já tinha sido muito especial, alucinante. A vontade de urinar me incomodava há mais de uma hora e foi só o tempo de colocar os pés no chão e abrir a bermuda, que alívio, não sei se agüentaria segurar até a Esplanada. Fiquei a 4km da guerra eletrônica, 14km do gramadinho seco e assim me despedi de Brasília em 2008. Valeu Evandro pela velha força e companheirismo, valeu Bruno, Luciano, Marcelo e todos os amigos do DF. Na imagem acima o tracklog do vôo, que teve duração de 2:40h, altura máxima 1.794m, máx. 8.5m/s, min. 5.9m/s e 60 km de distância ponto a ponto.

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